domingo, 25 de maio de 2008

papagaios são da chuva como eu sou da terra

Acordou assustado com a chuva na janela, já eram dez horas da manhã. Tinha perdido o horário que estava marcado para ir ao dentista. Ligou e pediu desculpas. Remarcou a consulta para outro dia, porque não tinha mais nenhum horário nesse dia. Era um sábado e os horários eram muito limitados. Enquanto tomava seu café, ouviu gritos. Abriu a janela e fechou o vidro. Através do vidro viu dois papagaios em cima do galho mais alto da árvore. Eles tavam encharcados e papagaiavam algumas coisas. Ele sentiu pena e não sabia o que fazer. Somente ficou olhando. "Pelo menos os dois tem um ao outro", pensou. Bebeu mais um gole de café. Os dois papagaios voaram até embaixo de um toldo. Ele se tranquilizou, não que estivesse muito preocupado, quem não pode tomar um banho de chuva? Sentou no sofá; a caneca agora estava vazia. Passou o resto da tarde pensando em algum livro para escrever ou uma canção para fazer. Mas não tinha experiência o bastante na vida para escrever algo que fizesse as pessoas gostarem. "Não consigo nem escrever algo para mim", pensou. Escreveu algumas palavras desconexas, não faziam sentido. Mas sempre sai alguma coisa, boa ou ruim, não importa. Não era algo pra ser lido com clamor, apenas era pra ler (posso dizer que quase travando). Ele não gostou, então deixou de lado e foi dormir.

Ele andava de uma forma mecânica, suas pernas iam sem os seus pensamentos. Ele tava pensando no que aconteceu no ônibus, antes de ele estar andando. Ele sentou no fundo do ônibus, onde tem cinco lugares juntos. Então, uma garota sentou no meio dos cinco lugares, deixou cair umas moedas. Ele pegou as moedas, ela agradeceu sorrindo e ele sorriu. Passando um tempo ela perguntou onde era o terminal que o ônibus parava, não para ele, mas para um rapaz que estava no outro canto. "Por que não para mim?", ele pensou. Eles estavam conversando agora, quase não dava pra escutar de tão baixo, mas dava pra perceber que o cara falava sobre sair em uma sexta e, tão rapidamente, pedia o celular dela. Ele se sentia constrangido com tudo isso e não conseguia parar de pensar. "Por que não perguntou para mim?", pensava. Sorriu indignado pela situação e olhou pela janela, as gotas da chuva eram finas e caiam intensamente; pois uma das mãos no rosto. Viu que o terminal estava chegando, porque para ele era o terminal que andava até o ônibus, e agradeceu por isso. Não quis ficar lá por mais tempo, ele levantou (antes do ônibus parar), pediu licença e passou. Com o guarda-chuva na mão e as pernas indo pensava em como ele podia ser a água e descer pelo bueiro. Chegou em casa, e cansado tomou seu banho. Depois ficou um tempo sentado no sofá olhando para a televisão. Não aguentou e foi dormir.

Acordou assustado com a chuva na janela, já eram dez horas da manhã. Tinha perdido o horário para ver o sol nascer. Mas via as nuvens se multiplicarem. Um papagaio se dividiu em dois e as árvores diziam estar lá embaixo do vôo deles. A chuva somou ao chão de cimento e o prédio enraizou suas colunas no chão, quase tombou. O papagaio que agora eram dois voou até a janela e se chocou contra ela e continuou fazendo isso. Ele assustado e aflito, pegou uma folha e escreveu:

"deixe-me ir, deixe acontecer, isso vai ser melhor pra mim!"

O prédio impelido pelas suas colunas, imergiu no chão. Levando ele e todos que moravam lá, soterrando seus corpos. Os dois papagaios tomavam a chuva em cima de uma árvore, no galho mais alto. Eles se apoiavam um no outro e cada um deixava meia lágrima se misturar com a chuva.

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